A importância da mulher na
produção da Região de Vitória da Conquista vem sendo há muito observada,
justificando a investida sob variados aspectos, não só como objeto de
investigação e propagação prioritária mas como instrumento de contestação de teorias
predominantes sobre o desenvolvimento e, acima de tudo, como experiências que
trazem em si grande potencial para geração de emprego e renda. A ênfase em
histórias de vida da mulher conquistense, em especial as que viveram o século
XX, põe em cheque a caracterização de várias regiões brasileiras como
atrasadas, inferiores, como prevê a concepção de desenvolvimento disseminada
entre nós, típica do pensamento ocidental.
A mulher a que se refere,
genericamente, são mulheres que tiveram grande quantidade de filhos e que pela
ausência de seus maridos (morte ou migração) assumiram o comando da família,
sendo verdadeiras economistas, apesar de semianalfabetas. Com parcos recursos
conseguiram encaminhar todos os filhos, garantindo uma dieta mais ou menos qualificada.
Com astúcia e determinação, atribuíram papéis aos filhos mais velhos,
conseguindo preparar para a vida toda uma legião de homens e mulheres. Foram
duras quando necessário sem titubear em suas empreitadas disseminando um estilo
de vida (ainda que por obrigação) inquestionavelmente sustentável. O que hoje é
propagado como ideal na utilização dos recursos, por exemplo, elas já punham em
prática há muito. O consumo é (ou foi) limitado, recorrendo a certos bens e
serviços apenas quando extremamente necessários. O ato de economizar e
reutilizar água, de reaproveitar a gordura e a nata do leite para fabricação de
sabão e manteiga, só para se ter uma ideia, são ações que fizeram parte de seus
cotidianos.
As restrições materiais que
enfrentaram não foram empecilho para o engenho de alimentos deliciosos e
saudáveis com os ingredientes disponíveis. Nesse contexto encontram-se doces
dos mais variados como os feitos com frutas em calda ou cristalizadas tipo
mamão verde costurado em calda ou jenipapo cristalizado pela exposição ao sol.
Sem falar nos biscoitos, bolos e outras guloseimas impossíveis de serem
esquecidas e dotadas de aceitação inquestionável, por isso mesmo, capazes de
gerar renda para milhares de pessoas.
As experiências exitosas não se
restringem à culinária que por si só permite abordar a cultura regional mas a
ações essencialmente “femininas” como higienização e arrumação de espaços, a
elaboração artesanal de roupas e outros instrumentos e, ainda o cultivo e
utilização de plantas ornamentais, comestíveis e terapêuticas como a infusão da
planta nativa chamada “tira noda” no álcool que alivia problemas na coluna.
Ainda que iniciada com exemplos
de mulheres do século XX, constata-se na geração mais contemporânea a
fundamental importância de mulheres na condução e liderança da família ou mesmo
no desempenho de papéis vitais ao lado de seus maridos, referendando a máxima
popular “por trás de um grande homem sempre existe uma grande mulher”. Num
outro contexto e com outros fatores explicativos, agora não apenas por morte ou
migração mas também por separação do casal (o que parece ainda mais comum) é
possível elencar inúmeras situações que a mulher como no mundo animal traz para
si a responsabilidade de amparo dos seus filhos. O homem abandona a família, não
dispondo muitas vezes de condições para financiar as despesas do lar (total ou
parcialmente), restando às mães o desempenho de múltiplos papéis, desde o de
conseguir dinheiro, até o de cozinhar, limpar, orientar nos estudos etc., o que
não raramente imprime uma dificuldade extrema denotando a perspicácia,
criatividade e bravura dessas cidadãs que com pouco dinheiro incrementa e
garante uma qualidade de vida bastante razoável. No item alimentação, por
exemplo, muitas vezes conseguem (muito mais pela inventividade) propiciar uma
qualidade superior a de famílias de maior poder aquisitivo.
No preparo de alimentos e
fabricação de produtos diversos essa outra geração toma como base as
experiências daquela, revisitando-as, todavia, com a incorporação de itens e procedimentos
condizentes com o período vivido. Exemplo disso se encontra na fabricação do
doce de leite com ou sem ovo que naquela época, talvez pela ausência de doenças
como diabete ou colesterol alto, as quantidades praticadas eram muito maiores.
Receitas de ambrosia (leite com ovo) contidas no livro da Professora Amélia
Barreto que aborda a alimentação no planalto de Conquista por volta dos anos
1930 indica para uma pequena quantidade de leite, doze gemas de ovos ou o doce
de leite cremoso que para cada dez litros usava-se cinco quilos de açúcar,
enquanto hoje na mesma quantidade apenas um quilo é adicionado.
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