A tese em análise “O espaço em movimento: o desvelar da rede nos processos sociotécnicos
do sistema de saúde de Vitória da Conquista, Bahia”, teve como objetivo principal
a investigação das relações entre os municípios polarizados por Vitória da
Conquista a partir do sistema de saúde. Utiliza o conceito de redes como
estrutural reconhecido como o que mais se adéqua à apreensão dos fluxos estabelecidos
entre as pessoas, os profissionais, os lugares nesse contexto. Conforme
descrito, “mediante as redes, há uma
criação paralela e eficaz da ordem e da desordem do território, já que as redes
integram e desintegram, destroem velhos recortes espaciais e criam outros”
(SANTOS,2004 appud FERRAZ, 2009, p. 66). Percebeu-se assim que o fenômeno
estudado é de difícil delimitação territorial, não permitindo contornos
rígidos, nem contiguidade espacial, o que coloca, para a autora, a necessidade
de se repensar o conceito de região[2].
Na análise realizada,
coloca-se a década de 1990, como o período em que o Estado da Bahia investiu em
grandes unidades hospitalares, como o Hospital de Base, quando se deu, também,
a modernização do Hospital São Vicente, a instalação de novos serviços no
SAMUR, a reforma do Afrânio Peixoto, as inaugurações do AMIC, no Bairro Brasil, do IBR,
do PROCORDIS e da clínica de Oncologia. Dessa forma, nas duas últimas décadas
do século XX e início do XXI a incorporação de tecnologia na saúde de Vitória
da Conquista foi intensa.
Percebeu-se que a maior parte
dos equipamentos pertence a iniciativa privada, sendo que das 354 unidades
existentes, 76% são privadas e 24% estatal. Paradoxalmente, o Estado por meio
do recurso do SUS é que mantém os hospitais e clínicas particulares, haja vista
que “como não há infra-estrutura
hospitalar suficiente para atender a demanda da população, o Estado contrata o
serviço de hospitais particulares” (p.84)
A política estadual de saúde
da Bahia é executada por meio da divisão em macrorregiões, denominadas
Nordeste, Sul, Extremo Sul, Sudoeste, Oeste e Norte. A macrorregião Sudoeste[3],
por sua vez, é composta pelas microrregiões de: Brumado (21 municípios),
Vitória da Conquista (21 municípios), Guanambi (20 municípios), Itapetinga (11
municípios).
Para além dessa
regionalização existe o processo de pactuação estabelecido entre os municípios
que significa transferência de recursos de acordo os serviços pactuados. Ocorre
que cada município tem autonomia para pactuar ou não dentro de sua região,
Assim, existem municípios que fazem parte da macrorregião, mas não pactuaram
com o município de Vitória da Conquista; municípios externos à macrorregião que
pactuaram; alguns que pactuaram em número reduzido, enquanto outros em maior
quantidade.
Constatou-se que a pactuação
define apenas, em parte, o fluxo entre as cidades, sendo as pessoas e suas
iniciativas que ditam o resultado final, pois não raramente desconsideram os
acordos pré-estabelecidos.
Concluiu-se, também, que serviços
particulares e de convênios geram fluxos entre as cidades numa lógica de
demanda espontânea, enquanto os decorrentes do SUS geram demandas
referenciadas. A rede, assim, exprime relações entre os municípios que indica
arranjos espaciais descontínuos como já enfatizado.
Com base na regionalização
aludida, Vitória da Conquista polariza aproximadamente 1.800.000 habitantes,
número que para o setor privado é bem maior. Segundo a autora a saúde-doença é
uma mercadoria lucrativa e objeto de disputas e interesses indiscriminados.
Entre as microrregiões de Brumado,
Guanambi, Itapetinga e Vitória da Conquista é possível dizer que em Vitória da
Conquista existem equipamentos que atendem problemas que requerem soluções de
alta complexidade, enquanto nas demais apenas de média complexidade.Das
unidades de saúde de Vitória da Conquista 76,8% prestam serviços de média
complexidade; 9,8% de alta complexidade; e 12% de atenção básica (p. 84)
A relação entre o município
de Vitória da Conquista e os de seu entorno apesar de em certos casos onera-lo
tendo em vista que quando se trata de procedimento de urgência independente de
acordo, ou pacto é obrigado a atender, acaba sendo um processo centralizador,
pois é nele que estão tanto equipamentos quanto profissionais especializados,
drenando para si grande parte da renda e mantendo um grande fosso para com as
demais realidades municipais da região, conforme pode ser observado a seguir:
“A oferta de serviços de
saúde que se concentra em Vitória da Conquista é muito desigual em relação aos
demais municípios da região. Embora as demandas estejam espalhadas no
território é em Vitória da Conquista que se concentram equipamentos e unidades
que o qualifica como município-polo de macrorregião de saúde [...]” (p.28).
Os resultados alcançados com
o trabalho são de grande valia, destacando, neste momento, a oportunidade
criada para uma ponderação sobre a questão regional em torno de Vitória da
Conquista. Evidencia como o espaço é banalizado na concepção e execução das
políticas públicas, em geral, restringindo-se a divisões territoriais
elaboradas indiscriminadamente a depender dos interesses envolvidos (e não como
quer SERPA, Angelo já mencionado).
[1] Resenha da tese da Professora Ana Emília de Quadro
Ferraz, intitulada: “O espaço em movimento: o desvelar da rede
nos processos sociotécnicos do sistema de saúde de Vitória da Conquista, Bahia”,
defendida em 2009 na Universidade Federal de Sergipe
[2] Em nossa avaliação a adoção do conceito de
rede não significa que o de região não dá conta da análise desse e de outros
fenômenos. Ver SILVA. J. B. da. Pelo
retorno da região. In: CASTRO, Iná E. et alli. Redescobrindo o Brasil. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
[3] Divisão territorial que vai de encontro a SERPA,
Angelo; MONTEIRO, Júlia. Políticas de desenvolvimento territorial e cultural no
território de Vitória da Conquista: uma análise geográfica da lógica de
localização de projetos. Goiânia: Revista eletrônica Ateliê Geográfico v.5,
n.3, 2011, onde se coloca que “a nova regionalização do Estado da Bahia [...]
visou a articulação das políticas estaduais no âmbito das diversas secretarias
a partir de uma mesma regionalização” (p.154-155), a de Territórios de
Identidade (grifo meu)
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